O olhar de Deus
- Frei Luis Felipe C. Marques, ofmconv.
- 26 de out. de 2024
- 3 min de leitura
Atualizado: 12 de nov. de 2024
No seu caminho em direção a Jerusalém, anunciando o seu terrível destino, Jesus revelou as exigências do seguimento: amor gratuito, renúncia aos bens e serviço desinteressado. Os discípulos tinham dificuldades de compreender e apresentaram estranhos desejos diante da proposta messiânica. Por diversas vezes, o próprio Jesus exortava e chamava atenção: “ainda não entendeis e nem compreendeis”; “tendes o coração endurecido”; tendes olhos e não vedes, ouvidos e não ouvis”.
Então, saindo de Jericó, junto com seus discípulos e uma grande multidão, antes de iniciar o percurso definitivo para Jerusalém, Jesus realizou a cura do filho de Timeu que era cego, mendigo estava sentado à beira do caminho. Era um homem conhecido simplesmente como filho de Timeu, ou seja, Bartimeu.
Esse encontro narrado pelos três evangelistas sinóticos, mais do que uma crônica, tem a intenção de mostrar um homem sendo acolhido e iluminado por Cristo. Bartimeu não estava dentro de Jericó, a cidade afundada no abismo, mas estava fora da cidade, onde Jesus desceu, antes de subir a Jerusalém a fim de procurar aqueles que estavam perdidos.
Não vendo os feitos do Cristo, mas sabendo de Sua fama, Bartimeu sentiu um desejo quando Jesus passava com a multidão. No meio do barulho e da balbúrdia das pessoas, brotou, da boca desse homem cego, uma oração persistente: “Jesus, Filho de Davi, tem compaixão de mim”. A única esperança daquele homem era de que o Messias curasse sua escuridão. Por isso, mesmo sendo repreendido, gritava mais forte no intuito de ser ouvido. Sua situação, fazia dele um homem vivo-morto. Ao ser chamado por Jesus, deixou toda sua segurança, simbolizada por seu manto, pulou e foi ao encontro Dele. O cego não suportava mais viver aquela condição.
Ser ouvido por Jesus era sua única esperança, pois tinha voz e audição, mas era impossibilitado pela falta devisão. Ele via com os olhos da fé, mas desejava ver com os olhos físicos.
Ao contrário do homem rico e sem identidade, que não tinha sido capaz de deixar o peso dos seus bens, Bartimeu despojou-se da sua única proteção: o seu manto. O gesto de jogar fora seu objeto protetor possui forte conteúdo simbólico. Sinaliza a renúncia de uma condição antiga, de hábitos velhos, de comportamentos incompatíveis com os do Reino. Somente depois de ter percorrido o caminho da libertação, Jesus pergunta: “O que queres que eu faça por ti?”. O Mestre queria saber qual era o autêntico desejo e a disponibilidade daquele homem. Desse modo, Bartimeu deseja recuperar sua dignidade e, por isso, é curado pela força de sua fé.
Como Bartimeu, nossa iluminação começará quando pela cura de nossa doença existencial. Quando nos levantarmos das doenças que nos paralisam à beira da estrada tentando tirar nossa dignidade e nossa visão de vida. A fé precisa, além de mudar determinadas situações, nos ajudar ter novos olhos que permitam ver diferente e ter atitudes diferenciadas.
Mais do que a cura da cegueira física, precisamos ver com os olhos da fé para enxergamos tudo com os olhos de Deus. Nada impede a visão ou o modo de olhar do Deus misericordioso: nenhuma trave bloqueia o seu enxergar. Nossa cura nos impele a ver tudo da forma como Deus vê. Nosso grande aprendizado é ver con o olhar primeiro e original de Deus: “Ele viu que tudo era bom e que o homem era muito bom”.
Ele nos dá a luz do Seu olhar e o brilho do Seu rosto. Somos curados para ver como Deus: com amor, compreensão e perdão. Somos curados para ver a beleza da vida e do amor. Esse é o projeto de Cristo para cada ser humano. Ele deseja que possamos ver os outros como Ele mesmo. Por isso, somente quando sentimos o olhar amoroso de Deus em nossa história é que conseguimos ver as pessoas com compaixão oferecendo-lhes um olhar que cura. O encontro, o diálogo e a abertura dos olhos para Cristo colocam o homem-cego diante de uma situação difícil, pois ele vivia sentado. A experiência de Bartimeu nos ensina que o caminho de quem encontra Cristo é desafiante. Esse encontro nos obriga a rever hábitos, comportamentos e relações. Encontrar com Jesus exige uma escolha radical: permanecer com o velho manto ou deixar-se iluminar por Ele para ver como Ele.
Senhor, ilumine as minhas ilusões. Ensina-me a deixar tudo aquilo que atrapalha o encontro contigo: a condição antiga, as falsas certezas, os hábitos velhos e os comportamentos incompatíveis. Recupera minha dignidade, dando-me vida e ressuscitando minha visão. Cure minhas cegueiras com o teu olhar. Ajuda-me a ver tudo com os teus olhos. Jesus, filho de Davi, tem piedade de mim!
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