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O Agora de Deus

  • Foto do escritor: Frei Luis Felipe C. Marques, ofmconv.
    Frei Luis Felipe C. Marques, ofmconv.
  • 21 de jan. de 2022
  • 4 min de leitura

Atualizado: 29 de jan. de 2022

O novo ano litúrgico nos permite acompanhar as intuições do evangelista Lucas. Embora, não tendo visto Jesus em vida, fez um criterioso estudo de todos os acontecimentos e escreveu para um “homem” chamado Teófilo. A nomenclatura do destinatário nos permite afirmar que tudo foi escrito para os “amigos de Deus” (theofiloi) e para aqueles que desejavam observar a profundidade da vida de Jesus.


O Evangelho de hoje está dividido em duas partes: o prólogo de Lucas (1,1-4) e o início da missão de Jesus em Nazaré (4,14-21). Após o prólogo, passamos para o início da missão. Essa missão começa com a leitura de um texto profético na Sinagoga. A profecia de Isaías revelava a chegada de um personagem misterioso que, investido pelo Espírito do Senhor, indicaria o tempo da graça, trazendo a salvação ao seu povo, proclamando a boa-nova aos pobres, a liberdade aos presos e a vista aos cegos. Esse texto é a “autoapresentação” de um profeta anônimo que testemunha a sua vocação e a sua missão.


Nada estranho para uma profecia destinada ao povo judeu. A novidade acontece quando ao final da leitura, revelando-se como sendo o próprio personagem da narrativa, Jesus fecha o livro e diz: “Hoje se cumpriu esta passagem da Escritura que acabastes de ouvir”. Até então, era apenas uma palavra proclamada como promessa futura, mas que na boca de Jesus, torna-se realidade: “Cumpriu-se hoje”. Cumpriu-se: a Palavra de Deus já não é uma promessa, mas realizou-se. Dessa maneira, Ele revela-se como O Agora de Deus, pois Nele, o futuro prometido, começa e se faz vida.


A relação entre o texto sagrado e o projeto de vida de Jesus realiza a profecia de Isaías. Os antigos destinatários, os pobres e os cegos, os prisioneiros e os oprimidos para quem Isaías falava tornam-se os destinatários de Jesus.

Lendo o texto, Jesus dá vida à Palavra atualizando-a para o hoje. A página de Isaías torna-se o programa do ministério e da missão de Jesus. A sua perspectiva é trazer alegria, libertação, liberdade e olhos curados.

O coração da mensagem e do anúncio de Jesus é a misericórdia de Deus. Jesus não anuncia somente a ação de Deus, mas, ao mesmo tempo, torna-se essa ação. Ele é o cumprimento da promessa. Uma nova história é iniciada. Fecha-se o livro. Abre-se a vida.

Jesus revela a imagem de um Deus diferente dos costumes locais e religiosos: não está interessado num discurso de fardos para carregar e de leis para observar. Em seu discurso, há um novo horizonte e o novo rosto de Deus anunciado. Com isso, vemos um Messias que não impõe fardos, mas os tira; que não traz preceitos, mas horizontes.

O projeto, a perspectiva e o discurso programático não são palavras jogadas ao vento. Há coerência entre a palavra proclamada e a ação realizada. Ele não apenas diz ser enviado aos pobres, mas vai ao encontro deles. Ele não proclama a libertação dos presos, mas os liberta de todas as prisões e opressões. Ele não somente anuncia a vista aos cegos, mas os devolve a visão. Dessa maneira, a palavra de Jesus é palavra verdadeira porque cumpre, imediatamente, o que estava sendo dito.


No segundo versículo do texto profético de Isaías está escrito: “para proclamar o ano da graça do Senhor e o dia da vingança do nosso Deus”. Entretanto, no texto de Lucas encontramos uma novidade particular e interessante, pois observamos a ausência da segunda parte do texto de Isaías: “o dia da vingança do nosso Deus”. Não há dúvidas de que Lucas revela um Jesus que não anuncia o dia de vingança e nem de desgraça, mas atualiza a profecia de Isaías e mostra um tempo de graça, misericórdia e paz.


Outra particularidade do evangelista é fazer a “teologia do hoje”. Essa teologia aparece nos momentos mais significativos da história em que narra: “Hoje, na cidade de Davi, nasceu o salvador” (Lc 2,11); “Hoje cumpriu-se esta palavra da Escritura que acabastes de ouvir” (Lc 4,21); “Hoje vimos coisas maravilhosas” (Lc 5,26); “Zaqueu, hoje eu devo ficar na tua casa” (Lc 19,5); “Pedro, eu te digo que hoje, antes que o galo cante, três vezes negarás conhecer-me” (Lc 22,34); “em verdade te digo, hoje estarás comigo no paraíso” (Lc 23,43).


A “teologia do hoje” nos permite acreditar que esta promessa é para nós. A palavra pode se cumprir no nosso hoje. Nesse hoje, a Escritura continua a se cumprir nas nossas prisões, cegueiras e opressões. Hoje, para cada um de nós, é sempre hora para escutar a voz de Deus. A boa notícia do Evangelho não consiste na oferta de uma moral melhor, nem mesmo na possibilidade do perdão dos pecados, mas na libertação de todas as opressões externas e internas que cegam o homem e o impedem de ver o novo tempo da graça do Senhor.


Senhor, ouvir a descrição da tua proposta é maravilhoso. Como é estupendo ver em tua vida, em teus gestos e nas tuas palavras, a realização plena das profecias anunciadas: libertação, liberdade, luz, vida e graça. Sinto-me alegre porque tenho a necessidade de escutar boas-notícias e de libertar-me dos meus pesos. Permita-me que os meus olhos estejam sempre fixos em ti. Ajuda-me a contemplar o novo rosto de Deus revelado em Jesus. Estou consciente de que não há outro programa de vida a ser observado e vivido que não seja o teu. Ensina-me a acreditar no agora dando-me certeza do teu hoje em mim.


LFCM.

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