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Ele está no meio de nós!

  • Foto do escritor: Frei Luis Felipe C. Marques, ofmconv.
    Frei Luis Felipe C. Marques, ofmconv.
  • 23 de abr. de 2022
  • 5 min de leitura

Na narrativa evangélica, apresentada pela liturgia de hoje, percebemos duas dinâmicas: a primeira, depois de dar a Paz, Jesus comunica o seu Espírito aos discípulos e dá-lhes o poder de vencer as forças do mal; a segunda, o famoso episódio da dúvida de Tomé. A Paz foi o método terapêutico utilizado para curar o fechamento, a culpa, o medo, o fracasso e o coração dos discípulos.

A Paz dada foi revelação do perdão e da superação do pecado. O Ressuscitado trouxe a Paz autêntica, pois mediante o seu sacrifício na cruz realizou a reconciliação entre Deus e a humanidade vencendo o pecado e a morte. Ao dar a Paz, Jesus confirma que não há obstáculo na nova relação entre Ele e os discípulos.

A experiência com Deus não se traduz de forma imediata e automática. Oito dias depois da morte de Jesus e das primeiras manifestações de que Ele estava vivo, as portas do Cenáculo continuavam fechadas. Então, Jesus voltou naquele lugar marcado pelo medo e permitiu que Seus discípulos pudessem experimentar Sua presença. Houve uma comunicação íntima entre o Senhor e os Seus discípulos: Jesus soprou sobre eles para comunicar Sua vida e os fazer reviver. Soprando sobre os discípulos o Espírito de Vida, os perdoou e os compreendeu.

O mesmo Espírito que Deus soprou na criação do ser humano para que fosse um ser vivente foi o Espírito que Jesus soprou sobre seus discípulos capacitando-os para serem os seguidores de sua missão. O mesmo Espírito que ressuscitou Jesus da morte foi o doador de vida aos discípulos. No dia da Ressurreição nasceu uma nova comunidade que, com a Presença de Jesus Ressuscitado, recebeu a autoridade do perdão e a possibilidade de dar a prova de um amor generoso, gratuito e incondicional para todos.

A dúvida de Tomé é o provérbio mais repetido nos dias atuais: “é preciso ver para crer”. Todavia, devemos entender quais são os verdadeiros motivos dessa reação. A partir das quatro vezes que Tomé fala nos Evangelhos observamos que Jesus não era a diversão de um momento, a solução de uma não aceitação pessoal ou a vaidade de uma novidade. Era tão entusiasmado com o seguimento que foi capaz de dizer no início do caminho: “vamos também nós para morrermos com Ele”. Porém, após a morte de Jesus, mostra-se frágil e incoerente com a proposta inicial. Tomé, vivencia uma crise de fé, passa da certeza de morrer “com” Jesus para a incerteza de "que" Ele está vivo. Os discípulos confirmam para ele: “se você estivesse aqui tinha visto”. No entanto, ele permanece desacreditando e afirma que somente tocando em Jesus é capaz de voltar a acreditar Nele. Além do mais, depois da morte de Jesus, Tomé é um discípulo que se isola da comunidade. Escolhe não ter mais o vínculo comunitário desejando dedicar-se à sua mística particular, tendo dificuldades de ver o Senhor Ressuscitado. Fechado em si mesmo, fecha-se para a comunidade e não consegue ver Jesus.


Jesus aparece-lhes novamente. Sendo capaz de entender a dúvida e o sofrimento de Tomé, mostra-lhe as feridas, as mãos perfuradas pelos pregos da cruz e o lado direito, dilacerado pela lança. Jesus responde à incredulidade de Tomé mostrando-lhe Suas feridas. O crucificado-ressuscitado nada argumenta, não discute, não reprova à dúvida e não exorta ao arrependimento pela descrença. Apenas mostra as chagas da paixão. A resistência de Tomé foi curada quando viu que Sua dor havia sido acolhida não tendo mais necessidade de tocar, professa a fé de maneira única e forte: “Meu Senhor e meu Deus!” Tomé não tocou, apenas escutou e viu.


A morte de Jesus provocou nos discípulos uma desilusão. Junto com a dor pela morte de seu Mestre, havia sentimentos de fragilidade e confusão. Eles se esconderam por medo e não tinham forças para recomeçar. A porta do cenáculo estava fechada, não apenas pelo medo dos judeus, mas porque os discípulos não tiveram a esperança na promessa. O sepulcro de Jesus estava aberto, mas eles permaneceram fechados no cenáculo. Dessa forma, o espaço que Jesus havia usado para se despedir de seus amigos e mostrar-lhes a missão do amor, paradoxalmente, tornou-se uma sepultura. Eles preferiram o fechamento, a murmuração, a culpa dos erros e o remorso das negações do que a promessa da ressurreição. A desilusão dos dias difíceis marcava a dificuldade de recomeçar e de renovar a esperança.


Para aqueles corações dominados por um horizonte de morte e naquele lugar fechado pelo medo, Jesus chega e diz: Paz a vós! Naquele lugar, naqueles corações habitados pelo medo, Ele traz a paz. Parece que os discípulos têm muita dificuldade em acolhê-Lo porque a mesma saudação fora repetida três vezes neste encontro. Embora se assemelhe a uma saudação comum para aquela cultura é o anúncio do cumprimento da missão: “deixo-vos a Paz, dou-vos a Minha Paz; Eu não vo-la dou como a dá o mundo. Não se perturbe o vosso coração, nem se atemorize”.

Onde quer que esteja o Ressuscitado, reina a Sua Paz, aquele Shalom, dom do Messias. A verdadeira Paz messiânica começa com a cura interior e paz no coração dos discípulos a fim de que eles possam transmiti-la aos outros.

Estando em comunidade, Tomé recebeu a força do Espírito que gerou nele a fé no Ressuscitado professando: "Meu Senhor e meu Deus”. A comunidade é sempre o melhor espaço no qual Deus se manifesta e se revela. Somente nela podemos fazer experiência da presença viva do Senhor Ressuscitado. Foi na comunidade que os discípulos foram impulsionados a perdoar e a saber perdoar. Somente junto com a comunidade reunida nossos olhos se abrem tendo capacidade de reconhecer a presença de Jesus. Ele não pode se manifestar em nossos individualismos e nos esconderijos da nossa mediocridade, mas se faz presente na comunidade e nela responde às dúvidas, os medos e às inseguranças. Por isso, separado da comunidade, não é possível fazer a experiência de Jesus vivo.


Tomé, chamado dídimo, gêmeo, é o irmão gêmeo de cada um de nós que sempre temos dificuldade de acreditar, por isso, escolhemos o isolamento em nossos individualismos doentios. Apesar da resistência de Tomé devemos ser gratos por ele nos ensinar que não basta ouvir que Jesus está vivo. É preciso fazer a experiência pessoal com Ressuscitado e ir ao encontro da comunidade. Ao mesmo tempo, não podemos apenas “culpar” esse discípulo por sua incredulidade.

Tomé duvidou porque o anúncio de que Jesus estivesse vivo parecia contraditório: os discípulos diziam que Jesus havia ressuscitado, mas oito dias depois estavam escondidos e trancados. Nada havia mudado. Tudo estava igual: eles viviam no medo e na desconfiança. “Como acreditar no anúncio e no testemunho desses discípulos? Estavam desanimados e cabisbaixos, tristes, medrosos e trancados...” deve ter pensado Tomé.

As narrativas pascais tornam-se um convite para observar se a nossa comunidade está sendo capaz de testemunhar que Cristo vive. O Ressuscitado coloca-nos um desafio dramático: a responsabilidade de mostrar ao homem atual, a realidade presencial de Cristo em nós. Tal como o Filho é o rosto e a imagem do Pai, assim também Seus discípulos devem viver agora, ou melhor, devem retratar o Filho que os recria e os envia. Pela cruz e pela ressurreição, a humanidade é reconciliada com Deus. Este evento deve ser anunciado a todos e os discípulos foram enviados para isso: aonde chegarem, necessitam fazer reinar a misericórdia de Deus, precisam viver o mandamento último do amor recíproco e devem comportarem-se como homens ressuscitados. Somente através da ressurreição dos discípulos que o Espírito do Ressuscitado continua vivendo e agindo no meio de nós.


Senhor Ressuscitado, cura-me das desilusões, dos fechamentos, das murmurações, das culpas pelos erros e dos remorsos pelas fragilidades. Ensina-me que as tuas manifestações me trazem a paz. Dá-me a compreensão do que é a ressurreição. Liberta-me dos meus medos e incredulidades. Ajuda-me a compreender o teu perdão amigo que me reconcilia contigo, comigo e com os outros. Permita que eu saia dos meus individualismos, dos esconderijos e da minha mediocridade para entender os mistérios da tua presença. Ressuscita-me contigo para que a tua presença esteja sempre viva no meio de nós!


LFCM.

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1 comentário


Marcia Severo
Marcia Severo
24 de abr. de 2022

Bom Dia Frei, sempre terei gratidão por me enviar essas palavras q me ajudam a pensar a me esforçar mais para sempre estar perto do Senhor , como Ele gostaria. Paz e Bem🙏🏽🙏🏿🙏🏻

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