A necessidade da experiência
- Frei Luis Felipe C. Marques, ofmconv.

- 13 de jan. de 2024
- 4 min de leitura
Atualizado: 20 de jan. de 2024
O Evangelho deste domingo começa com João Batista apresentando Jesus ao vê-lo passar como o “Cordeiro de Deus" e termina com Jesus fixando o olhar em Simão dando-lhe nova missão: "Tu és Simão, filho de João; tu serás chamado Cefas" (que quer dizer: Pedra). A mudança do nome indica a profunda novidade que Cristo traz para a vida de Pedro. Em ambos os casos, o olhar de Jesus é intenso e profundo. Nos Sinóticos, esse novo nome é dado a Pedro em resposta à sua profissão de fé. Em João, é puro dom e efeito da intuição do Mestre que sabe ver o nome e a vocação de cada ser humano.
A liturgia nos oferece no início do tempo comum um Evangelho peculiar sobre o chamado dos dois primeiros discípulos do Mestre. A primeira fala de Jesus, encontrada no Evangelho de João, é dirigida aos seus dois futuros seguidores: “O que estais procurando?”. Entretanto, no Evangelho de Lucas, uma pergunta semelhante é dirigida aos seus pais no Templo de Jerusalém: “Porque Me procuráveis?”. Também, após a ressurreição, dirigindo-se à Maria Madalena, Ele questiona: “Mulher, porque me procuras?”.
A liturgia de hoje nos ensina que somos movidos por desejos que não, necessariamente, num primeiro momento, necessitam ser claros ou conscientes. Do jeito que o Mestre nos encontra, Ele nos leva consigo e com nossos desejos incipientes educando-nos aos poucos para entendermos o que é realmente necessário e importante em nossa caminhada.
Quando procuramos algo é porque reconhecemos que nos falta. Embora, não saibamos o que procuramos e muito mesmo se o que procuramos é o melhor para nós, nenhum novo caminho pode ser iniciado sem a questão: o que procuro na vida? Jesus, Mestre e Exegeta do Coração, interessa-se pela verdadeira motivação daqueles que O procuram com sinceridade. Ele deseja compreender a razão da procura e da escolha. Ele deseja que as motivações sejam lúcidas e conscientes. Os dois primeiros discípulos respondem de forma simples o questionamento do Mestre. Eles não procuram uma resposta teórica, uma verdade absoluta, uma fórmula teológica. Eles procuram uma relação. No desejo de uma relação familiar, eles perguntam a Jesus: “onde moras?”. Os discípulos ao desejaram saber onde é o lugar físico em que habita o Mestre, revelam que desejam manter uma intimidade com este homem diferente. Entrar na casa de alguém é a oportunidade de experimentar intimidade e de partilhar um espaço vital e pessoal.
Jesus não dá nenhuma resposta concreta à pergunta dos discípulos, mas os faz um convite aparentemente vazio: “Vinde ver”. Ele revela a necessidade da experiência. Os discípulos deveriam ter mais clareza da habitação de Jesus. Eles estariam mais seguros e protegidos. No entanto, o convite de Jesus exige mais do que tomada de consciência de quem Ele é. O convite do Mestre exige coragem de segui-Lo sem ter a certeza de tudo saber. É na coragem que se encontra a possibilidade de descobrir. Esta narrativa nos permite encontrar detalhes significativos para nossa atual caminhada cristã e para nossas questões existenciais.
Os discípulos foram ver onde Jesus morava. O evangelista João diz que era por volta das 4 horas da tarde. Para o narrador é fundamental apresentar esse horário. Ele quer dizer que a decisão de seguir Jesus tem hora exata e marca histórica. É uma decisão que muda toda a vida. Às 4 horas da tarde tem outro significado simbólico. No tempo de Jesus esse horário marcava a conclusão do trabalho diário.
O evangelista quer dizer que após a grande jornada de trabalho e de procura, os discípulos encontram o que incessantemente procuravam. Daquela hora em diante, nada mais é igual. Os discípulos estavam à procura do sentido da vida e percebem que acabam de encontrar: Jesus Cristo.
O convite de Jesus é habitar o espaço do mistério. Esses primeiros discípulos, seguidores de João Batista, da sua vivência e da sua penitência, se maravilham com a proposta de Jesus e colocam-se no desejo de edificar um caminho de propostas diferentes. Percebemos que os dois discípulos estavam procurando outra proposta que não fosse a mesma do profeta do Jordão. Na procura por algo novo, eles encontraram Jesus que lhes apresentou, não uma doutrina, mas a comunhão da vida numa relação profunda de intimidade concreta e real.
O discipulado de Jesus é marcado por uma relação viva e experienciada cotidianamente. Não é um saber ou um fazer, mas um caminhar e um conhecer. “Vinde ver” é o duplo convite de Jesus para todos que O procuram. “Vir" a Ele para “ver” e experimentar aprendendo coisas divinas, palavras e gestos. Ele próprio, mais tarde, convidará: “Vinde a Mim, todos os que estais fatigados e oprimidos [...], e aprendei de Mim, que sou manso e humilde de coração, e encontrareis descanso para as vossas vidas”. É permanecendo com Jesus e em Jesus que os discípulos são formados na Sua escola e confortados ao Seu coração e à Sua lógica a fim de poderem pensar e agir, não segundo a mentalidade do mundo, mas segundo as coisas de Deus.
Senhor, ensina-me a procurar-Te com sinceridade de coração. Dá-me a graça da lucidez e da consciência em minhas escolhas diárias. Concede-me a compreensão de que habitar o espaço do mistério exige de mim uma relação viva formada por Ti e conformada em Teu coração humilde e manso.


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