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A glória do amor

  • Foto do escritor: Frei Luis Felipe C. Marques, ofmconv.
    Frei Luis Felipe C. Marques, ofmconv.
  • 25 de mar. de 2023
  • 5 min de leitura

A passagem da morte à vida constitui o centro do itinerário quaresmal. Os propósitos que fazemos servem para eliminar as situações de morte a fim de contemplarmos a vitória de Cristo em nossas vidas. A Páscoa de Jesus está cada vez mais próxima e a Igreja nos insere a necessidade do reencontro com a vida. Purificados com a água do Batismo, iluminados por uma viva fé, vamos ao encontro de Cristo, nossa Páscoa.


O evangelista João nos diz que a força e a autoridade de Cristo foi capaz de vencer não apenas sua própria morte, mas também a morte daqueles que estavam ao seu redor. A presença de Cristo consolava trazendo vigor e ressurreição. Jesus tinha uma relação muito fraterna com seus amigos Lázaro, Marta e Maria. Na casa deles, Ele encontrava descanso, acolhida e atenção. As irmãs de Lázaro mandaram informar a Jesus que seu amigo estava muito doente. Ao saber da situação de morte que Lázaro se encontrava, Jesus não ousou dizer que aquela doença serviria para manifestar a glória de Deus, por isso, não compareceu imediatamente ao comunicado das irmãs. Após o terceiro dia da notificação, Ele dirigiu-se à casa de seus amigos.


Diante de mais uma incompreensão dos discípulos, Jesus declarou: “Lázaro está morto. Mas por causa de vós, alegro-me por não ter estado lá, para que creiais. Mas vamos para junto dele”. Os discípulos ficaram maravilhados com a iniciativa de Jesus e questionaram a necessidade de Ele voltar àquele lugar. A amizade de Jesus com Lázaro expôs sua vulnerabilidade: “Mestre, ainda há pouco os judeus queriam apedrejar-te, e agora vais outra vez para lá?” Mesmo assim, Ele foi capaz de se expor à morte para salvar seu amigo: “ninguém tem amor maior do que aquele que dá a própria vida pelo amigo” (Jo 15,13).

De fato, no evangelho de João, o motivo principal da condenação de Jesus foi ter restituído a vida ao seu amigo. Todos os sinais e todas as palavras de Jesus nunca questionaram tanto os judeus e os fariseus como ressuscitar um morto. Para eles, a ressurreição era fato escandaloso e perigoso.

Jesus não se resignou com a doença de Lázaro e voltou a Betânia, casa do sofrimento. Quando lá chegou, Lázaro já havia sido sepultado há quatro dias. Marta sabendo que Jesus tinha chegado, foi ao seu encontro: “Senhor, se tivesses estado aqui, meu irmão não teria morrido”. A fé de Marta fez com que ela declarasse que no lugar em que está Jesus, a morte não habita. O amor e a amizade por Jesus, vence a morte. No entanto, diante do túmulo, ela reagiu de modo diferente. Era necessário fazer um caminho de conversão. Ela sabia tudo sobre Deus, mas não acreditava na possibilidade da ressurreição do irmão. No texto, várias vezes, Marta repetia “eu sei”. A sua fé era constituída de conhecimento. Ela "sabia", mas não acreditava. Quando Jesus mandou tirar a pedra do túmulo de Lázaro, Marta quis impedi-lo, pois o cadáver cheirava mal...


Maria, a outra irmã, parecia uma viva-morta. A morte de seu irmão fez com que ela não quisesse mais sair de casa. Ela somente chorava desesperadamente. Foi necessário chamá-la: “O Mestre está aí e te chama”. Quando Maria ouviu isso, levantou-se depressa e foi ao encontro de Jesus. Seu pranto fez com que o Mestre ficasse profundamente comovido e emocionado. O encontro com sua amiga Maria, fez com que Ele percebesse o ambiente de morte que habitava a casa de seus amigos.

Todos haviam morrido. Marta tinha a fé do conhecimento, Maria o desespero e a solidão e Lázaro estava morto no sepulcro. Depois de ter iluminado a fé de Marta, o chamado de Jesus fez com que Maria saísse do “sepulcro” que havia construído para si mesma. Então, Marta e Maria junto com Jesus e os seus discípulos foram ver o lugar no qual se encontrava o amigo morto. O amor de Jesus por essa família era tão grande que Ele também chorou. Sim, Jesus chorou!

Na narrativa vemos não apenas a morte física de Lázaro, mas também a morte espiritual e a ausência da esperança que habitava os corações das duas irmãs. Era preciso que ambas saíssem da sepultura. Certamente, a morte de um ente querido faz morrer algo em nosso interior, por isso, podemos entender o sentimento daquelas irmãs. O que sentiam era real e concreto. A morte será sempre uma história de dor e de lágrimas, sobretudo, para aqueles que não crêem. O texto revela a pedagogia de Jesus para recuperar a fé de Marta e de Maria. Entretanto, Nele havia o desejo de amor e de amizade e não apenas de recuperação da fé das irmãs.

Na Bíblia, a morte não é exclusivamente biológica, mas é uma realidade complexa, articulada e variada. Uma realidade que se insinua em muitos âmbitos da vida humana: a morte de um povo, a vida sob o domínio do ego, a morte da amizade e a morte física. A passagem da morte à vida é o caminho relacional da fé, do amor e da esperança. Sob o olhar de Jesus, a morte serve para manifestar a glória de Deus. No evangelho de João, essa glória é a glória do amor.

O sepulcro e a pedra representam a imagem de todas as situações de morte para as quais não existe vida e que nos fazem sentir fracos e desesperançosos. O desespero e a profundidade dos sepulcros que construímos podem fazer morrer nossa fé. Somente o encontro com a Vida, Jesus, pode nos libertar das pedras que colocamos sobre nossas cabeças fazendo-nos sair de nossos sepulcros. De fato, a vida quando não habitada por Deus torna-se um sepulcro. Estar distante de Jesus é nos expor à morte vulnerável com as situações ruins que vivem próximas de nós. Contudo, o Evangelho nos revela que Jesus não teme as situações de morte que podem nos habitar.


Todos podemos nos encontrar na situação de Lázaro, cujo nome significa “Deus ajuda”. Eu sou aquele a quem Jesus ama e que está “doente”. Essa é a realidade de cada um de nós. O cansaço que nos habita é tão pesado como a pedra do sepulcro de Lázaro. Somente a autoridade de Jesus pode fazer rolar a “pedra” que se esconde em nossas vidas fazendo-nos sair para fora e despertando-nos do sono da morte. A voz divina é a voz que toca e desperta as forças da vida desconhecidas por nosso interior. A voz divina ativa nossa identidade fazendo-nos voltar ao nosso ser essencial. A voz divina reconstrói nossa dignidade ajudando-nos a nos conectar com o nosso ser profundo.

É preciso sair de tudo aquilo que diminui nossa existência, as sepulturas existenciais que entramos ou que nos colocaram. Fomos feitos para à luz, à beleza, ao amor e à vida. O “sair para fora” dito por Jesus é o convite para abandonarmos as sombras dos preconceitos, dos esquemas medíocres, dos egoísmos autorreferenciais e para nos libertarmos da escravidão dos vícios.

Hoje, Jesus ainda repete: “Tirai a pedra”. Deus não nos criou para o túmulo, Ele criou-nos para a vida bela, boa e alegre. Jesus restaura a vida de um cadáver em decomposição. Às vezes, nos sentimos perdidos, sem futuro. Voltar à vida nos parece impossível. Jesus pode remover a pedra que está esmagando nossas vidas abrindo-nos os túmulos. Entretanto, nos cabe a coragem para levantar, sair e enfrentar a realidade. Todavia, a jornada de libertação não é imediata: Lázaro tinha os pés e as mãos amarrados. Ele necessitava da ajuda da comunidade para se tornar livre da morte que o habitava. As ataduras da culpa e as crenças limitantes do nosso passado devem ser retiradas pelos amigos que nos cercam. Amar é libertar o outro das situações de morte que o aprisionam e impedem o mover do Espírito.


Senhor, ilumina minha fé na força da tua presença, da tua amizade e da tua Palavra. Sei que onde estás, a morte não tem espaço. Ajuda-me a sair de minhas sepulturas existenciais voltando à relação contigo. Que a tua voz penetre o profundo de meu coração ajudando-me a despertar do sono da morte. Remove as pedras que esmagam minha vida e aprisionam-me em culpas do passado. Dai-me a certeza de que fui feito à luz, à beleza, ao amor e à vida.


LFCM.

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1 comentário


Marcia Severo
Marcia Severo
26 de mar. de 2023

Bom Dia Frei!!! Sinto muito a necessidade de ter meus amigos por perto. Desejo estar sempre perto de nosso Senhor meu grande e amado amigo. Paz e Bem🙏🏽🙏🏿🙏🏾

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