A fé insistente
- Frei Luis Felipe C. Marques, ofmconv.

- 18 de out.
- 3 min de leitura
Na parábola de Jesus, encontramos dois personagens contrastantes: um juiz corrupto e uma viúva pobre. O juiz, que “não temia a Deus” nem tinha consideração por ninguém, representa a ausência total de justiça verdadeira. Movido por interesses próprios, ignorava o sofrimento alheio. Em contrapartida, a viúva, símbolo de fragilidade social e exclusão, não possuía recursos, influência ou defesa. Sua única força era a insistência: sem meios para subornar ou recorrer a aliados, clamava com perseverança por justiça diante de um sistema indiferente.
Sua persistência não nasceu da força, mas da fraqueza transformada em confiança. Sem pretensões, a viúva revelou coragem, humildade e determinação ao não desistir. O juiz, embora injusto, acabou cedendo por puro incômodo, e não por compaixão.
Jesus não exalta o juiz, mas destaca a fé perseverante daquela mulher. Assim como ela, os discípulos são convidados a rezar sem desanimar, confiando que Deus, ao contrário do juiz corrupto, escuta com atenção e age com justiça em favor dos seus escolhidos. A parábola ensina que a perseverança na oração move o coração divino.
Não podemos imaginar que o juiz represente Deus, pois sua atitude corrupta contrasta com a justiça divina. O verdadeiro destaque está na insistência da viúva, núcleo do ensinamento de Jesus: a oração perseverante. Orar nem sempre é fácil, pois enfrentamos o cansaço diante da “demora divina” e a dificuldade de manter mente e coração firmes.
Contudo, a oração fortalece a busca, ilumina as escolhas, alimenta a esperança e sustenta a fé. Ela nos liberta do comodismo e do imediatismo, tornando-se necessidade vital. Sem fé, restam apenas ritos vazios e superstições; rezar é ato de fé viva e esperança confiante.
Lucas é o evangelista que mais destaca a dimensão orante do ministério de Jesus, mostrando que a oração é o alicerce de toda ação. Nesta parábola, ele ensina a necessidade de rezar sempre, fazendo da oração não um momento extraordinário, mas o clima que envolve a vida cristã. Desde o batismo no Jordão (Lc 3,21), a oração aparece como força da missão de Jesus e revela sua comunhão com o Pai. Ela desperta nos discípulos o desejo de aprender a rezar (Lc 11,1) e os atrai à vida filial. Jesus retira-se para lugares desertos (Lc 5,16; 9,18), passa noites em oração (Lc 6,12) e é transfigurado durante a prece (Lc 9,28). Vigiar e orar une a vida do Mestre à dos seus seguidores.
A experiência mais difícil para quem crê é enfrentar o silêncio de Deus. Continuar a pedir sem sentir-se ouvido exige maturidade espiritual e confiança profunda. A oração não muda a vontade divina, mas transforma nosso olhar, abrindo-nos a novas perspectivas diante das situações. Ela não busca convencer Deus de nossos desejos, mas nos insere em seu projeto de bondade.
Orar é o melhor caminho para manter o equilíbrio nos momentos de crise e evitar atitudes impacientes diante do Reino. Pela oração, aprendemos a respeitar a liberdade e a diferença, sem impor consciências. Mais que palavras insistentes, toda nossa vida deve tornar-se oração: pensamentos, ações e desejos sintonizados com Deus.
Para que o mal não nos domine e sejamos libertos de paixões desordenadas, não podemos restringir a oração a momentos específicos do dia. É preciso viver numa atitude contínua de vigilância e comunhão, fazendo da vida uma oração permanente. Orar é reconhecer o primado de Deus em tudo, relacionando-se com Ele livremente e não apenas quando há necessidade. Estar em constante ação de graças nos faz perceber que Deus não é apenas um desejo entre outros, mas o único e precioso Bem que dá sentido à existência. Assim, permanecendo n’Ele, discernimos o essencial e aprendemos a viver cada circunstância como expressão de uma relação viva com o Senhor.
Senhor, ensina-me a rezar e a viver constantemente na tua presença, reconhecendo o teu primado em minha história. Torna-me gratuito na busca por Ti e faz-me compreender que a oração não é apenas um momento especial, mas a entrega de toda a minha vida. Dá-me a intuição do que é essencial, força para buscar, discernimento para escolher, silêncio para escutar, esperança para viver e fé para perseverar no caminho que conduz à vida eterna. Amém.


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