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Um inusitado Rei

  • Foto do escritor: Frei Luis Felipe C. Marques, ofmconv.
    Frei Luis Felipe C. Marques, ofmconv.
  • 23 de nov. de 2024
  • 3 min de leitura

Atualizado: 8 de fev.

No dia de Cristo, Rei e Senhor do Universo, a liturgia quer nos recordar um espetáculo em torno da condenação de Jesus, pois os prisioneiros condenados a cruel execução, favorecendo o escárnio político e o sarcasmo imperial, eram vestidos com insígnias reais e tratados como imperadores. Eles eram coroados e com manto cor de púrpura recebiam aclamações do povo. A cruel execução era um evento local e constituía um espetáculo popular. A narrativa de João confirma esse cenário de escárnio cruel.

O Mestre, vestido de cores reais e despido da sua dignidade divina, foi amarrado, insultado, acusado e levado diante das autoridades de Jerusalém. Hoje, algumas imagens de Jesus trazem-O vestido e coroado como rei e não com a coroa de espinhos. No entanto, isso manifesta concretamente a continuação da zombaria do Estado para com a cruz redentora e com a humana-divindade do Cristo.

Pilatos era um homem possuidor de habilidades diplomáticas e cinismo político. Ele era desprezado pelo povo judeu e pelos líderes religiosos. O seu conceito de poder era hedonista e manipulador. Ele conseguia manter-se no poder apenas aproveitando a fraqueza do outro. Por isso, queria entregar Jesus ao julgamento, não assumindo o projeto de matar um inocente. Com sua neutralidade, Pilatos exercia a indiferença diante da injustiça. Ao perguntar para Jesus se Ele era rei, assumia sua perplexidade diante de um estranho rei.

O Cristo estava solitário, desarmado, sem soldados para defendê-lo e abandonado pelos seus próprios amigos e seguidores. Contudo, o próprio Jesus tentou ajudar Pilatos a compreender que o Seu Reino não tinha nada a ver com os reinos mundanos.

Os reinos do mundo sempre foram marcados por domínios, privações e coerções. Tudo era baseado no poder ambicioso, na ausência da liberdade, no uso da força, no controle das armas e na manipulação do dinheiro. Quanto mais o poder mundano matava, mais se tornava mãos fortes e potentes.

Desse modo, o Reino revelado por Jesus nada tinha em comum com os reinos conhecidos por Pilatos. Jesus era portador da vida e não de morte. Ele era um servo obediente e não se aliava aos grandes e poderosos. O Seu poder havia sido constituído pelo Alto e o Seu Reino não era de domínio, mas de serviço. O Reino do Cristo não era pensado e praticado por uma teologia de domínio, nem mesmo pela violência coercitiva. Não se servia de armas e de falsas narrativas.

Para Jesus grande é aquele que serve. A lógica do Seu reinado difere da mundana e da lógica de Pilatos. O Mestre recusa toda e qualquer forma de violência absolutista: “Se o meu reino fosse deste mundo, os meus guardas lutariam para que eu não fosse entregue aos judeus. Mas o meu reino não é daqui”.

Ele é um rei atípico. Seu poder é marcado pela potência do amor. Ele reina entregando sua vida. Um rei crucificado seria contradição. Um rei que tocara leprosos, que preferia a companhia dos excluídos e não dos poderosos das nações, que lavara os pés dos seus, que se despojava de seu poder, das suas riquezas e que não se defendia, torna-se um rei inusitado, incomum, surpreendente. 

Somente um Rei potencialmente divino lavaria os pés de seus discípulos e alimentaria com um pedaço de pão o seu traidor. Deus é onipotente no amor! Não tenhamos medo Dele, pois Ele nos julgará amando-nos até o fim. O Cristo veio para dar testemunho da verdade, do amor, do serviço e da doação. Sem a verdade do amor, a existência tornar-se-ia sombria, sem sentido e desencarnada. Nesse sentido, a verdade não é uma realidade abstrata, nem sequer deve ser reduzida a uma doutrina ou a uma ética. Ela é antes de tudo, uma vida, a vida de Jesus, a vida de um homem conformado pelo amor e pela vontade de Deus. Jesus é Rei do universo, Rei de toda a humanidade porque Nele habita a plenitude humana. Impregnar-se da verdade do amor é humanizar-se para vivenciar o amor na verdade.


O principal poder de Cristo é dar a vida pelo outro. Seu primeiro trono foi a manjedoura, em meio aos animais. Seu último trono foi a cruz, no meio dos pecadores. Seu cetro real é a humanidade encarnada. Seu poder imperial consiste na oferta da sua vida. Esse entendimento nos permite corrigir a imagem de um Cristo que comanda tudo do alto. Precisamos compreender e professar que Ele caminha ao nosso lado, doando-nos a força divina para crescer no caminho humano da fé e nos conduzindo, além do sofrimento e da morte, para uma vida sem fim, plenificada de amor e de esperança.


Senhor, dai-me força para renunciar às lógicas mundanas aderindo a lógica do Evangelho. Ensina-me que maior é quem serve e doa sua vida. Liberta-me dos poderes mundanos e dos projetos de morte. Desejo ser plenificado na verdade do amor e no testemunho de humanidade. 


Imagem: Romolo Piccoli

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1 Comment


Teo.marcos77
Nov 24, 2024

Maravilhoso frei

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