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Três abraços que moldaram uma vida

  • Foto do escritor: Frei Luis Felipe C. Marques, ofmconv.
    Frei Luis Felipe C. Marques, ofmconv.
  • 4 de out. de 2020
  • 3 min de leitura

Atualizado: 5 de out. de 2021

Nos primeiros anos da sua vida, Francisco não conseguia perceber o diferente que estava ao seu lado. O jovem Francisco cuida somente dos seus amigos e daqueles que com ele podiam gozar do luxo de uma vida distante da realidade efetiva do mundo. Uma realidade destinada para poucos. Dessa forma, somente uma singular experiência poderia fazê-lo sair de um estilo de vida irrefreado e quebrar as correntes que aprisionavam o seu coração. Essa singular experiência manifestou-se de forma humana através de três abraços e três beijos: do crucificado, do leproso e do bispo.


O abraço do crucificado ferido e pendente na cruz, na pequena capela de São Damião, libertou Francisco da escravidão do egoísmo, da vaidade, da autossuficiência e do orgulho. O abraço do leproso, desfigurado pela dor e pela indiferença dos transeuntes, curou as feridas do coração de Francisco e curou os seus olhos autorreferenciais, permitindo-lhe ver o outro como beleza e a contemplar a dignidade do diferente. O abraço do bispo, representando a acolhida da Igreja, fez Francisco declarar a paternidade fundamental de Deus que nos faz “todos irmãos”.

Os três abraços conformou Francisco ao Evangelho e o fez querer abraçar não somente três realidades. Os três abraços fizeram com que Francisco deixasse de adorar somente a si mesmo. Esses três abraços abriu-lhe um horizonte de disponibilidade ao mistério de Deus e de reciprocidade com o mistério dos irmãos.

Os três abraços fizeram Francisco receber irmãos e depois disso nada mais precisava ser dito, já tinha entendido qual seria a sua vocação, como ele mesmo relata no seu Testamento. Os três abraços fizeram de Francisco não um filho, mas uma terna mãe. Os três abraços fizeram de Francisco um reformador sem intenção, um profeta sem palavras e um mártir sem sangue. Ademais, os três abraços fizeram de Francisco um Evangelho vivo e um homem inesquecível. Os três abraços empurraram Francisco até o Oriente para abraçar o sultão muçulmano. Os três abraços conduziu-o a abraçar a toda a criação. Por fim, os três abraços fizeram com que ele fosse capaz de abraçar, com gratidão, a última barreira da condição humana, a morte.


Dessa forma, Francisco torna-se o homem do contato e do contágio, dos abraços e dos beijos, sem medos e sem desesperos. Palavras e gestos que nos amedrontam hoje. Ele nos convida a contagiar os outros não com lamentos e murmurações, com a negatividade da vida e com a desesperança do futuro, com retóricas vazias, com vírus e ideologias, mas a contagiar tudo e todos com abraços e beijos, no reconhecimento de que tudo é dom, difundindo o bem e contagiando com a paz o mundo que vivemos e as relações que encontramos.


Quem poderia imaginar que um abraço, nesse caso três, mudaria tudo? Estamos provando a dura condições como um abraço é capaz de mudar tanta coisa, seja a sua ausência como a sua permanência. A ausência do abraço está sendo justificada como proteção. No entanto, a falta dele está revelando a nossa mais cruel vulnerabilidade: não podemos viver sozinhos.


Lamentavelmente, esta foi a opção que fizemos. Este foi o caminho que escolhemos para não sermos perturbados na nossa intimidade e individualidade. Esta foi a melhor escolha diante das feridas abertas no passado. Com tudo isso, nos especializamos em construir projetos sozinhos e altos muros. Entretanto, algo tão pequeno, potente e invisível está revelando que não é mais possível continuarmos na forma do passado. Não podemos viver sozinhos, nem protegidos por muros e projetos. Somos comunhão. Sem contatos e sem contágios não podemos construir histórias de salvação. Dessa forma, o tempo está nos revelando e pedindo que tomemos consciência que sem abraços, sem beijos e sem relação não podemos mais viver, porque um “abraço” ou três “abraços”, um “beijo” ou três “beijos” mudam tudo, mudam a nossa forma de viver e de testemunhar o Evangelho.

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