O projeto originário
- Frei Luis Felipe C. Marques, ofmconv.
- 5 de out. de 2024
- 3 min de leitura
Atualizado: 2 de nov. de 2024
Na caminhada para Jerusalém, onde aconteceram os eventos da Sua paixão e morte, Jesus sofreu muitos confrontos com as autoridades políticas e religiosas. A mentalidade escrupulosa dos fariseus colocava todo o relacionamento humano dentro das dimensões lícitas ou ilícitas. Desse modo, entre Jesus e os fariseus existia um modo diferente de interpretar as Escrituras e de vivenciar a relação com o sagrado.
Jesus sempre procurava ler as Escrituras profundamente e não superficial. Ele não fazia violência com o texto sagrado, direcionando-o para o seu próprio interesse, mas sempre apontava à verdadeira face do Deus compassivo e misericordioso.
Os fariseus desejosos de colocá-Lo à prova, apresentaram-Lhe uma pergunta. Com seus pensamentos tradicionais, eles baseavam seu confronto sempre no campo doutrinal, sobretudo, no modo de compreender e de interpretar a lei judaica. A questão era sobre a legitimidade do divórcio. Uma importante pergunta, pois tratava de uma situação que alimentava sofrimento às mulheres da Galileia e motivava discussões entre as diferentes escolas rabínicas. Segundo a Lei de Moisés, o marido podia romper o contrato matrimonial e expulsar sua esposa de casa. A mulher, pelo contrário, submetida em tudo ao homem, não podia fazer o mesmo.
Para Jesus, Moisés escreveu uma norma disciplinar pela dureza do coração e pela interpretação abusiva que faziam da Escritura.
A resposta de Jesus surpreende a todos. Ele não entra nas discussões dos rabinos, mas convida todos a descobrir o projeto original de Deus. A Sua resposta não focou na questão do repúdio-divórcio, mas exaltou a dignidade da mulher e esclareceu o significado original do texto bíblico. Não foi Moisés quem introduziu o divórcio. Ele colocou algumas disciplinas para acabar com os abusos e para proteger as mulheres. Alguns homens queriam resguardar o direito de repudiar a mulher sem perturbar suas próprias consciência. Eles procuravam maneiras a fim de justificar os egoísmos e os abusos. Entretanto, essa tentativa era intolerável e injusta, por isso, Jesus se opôs a toda instrumentalização da lei mosaica.
A aliança existente entre os homens é um espelho da aliança que une Yahweh ao seu povo e a toda a humanidade. No projeto originário do Criador, o homem foi criado e convocado para completar vivendo em comunhão e não para dividir vivendo na solidão. O homem reconhece sua dignidade quando percebe que o "novo" ser criado era sua própria parte. A identidade foi reconhecida não apenas na soma, mas na comunhão da unidade. A mulher, alteridade por excelência, foi tirada do lado, como se fosse o outro lado da mesma humanidade. Jesus coloca a mulher em condição de igualdade com o homem ao afirmar que ambos cometem adultério.
A atitude de Jesus é coerente com sua trajetória. Ele procurava ser o autêntico intérprete da lei, não pelo legalismo, nem por fundamentalismos baratos, mas proclamando de forma profética e fiel a vontade de Deus para com os mais frágeis, os pecadores públicos e os excluídos da sociedade. O objetivo central de Jesus é proteger aqueles que se encontram à margem, os marginalizados. Depois de ter respondido a questão do repúdio da mulher, Jesus defende as crianças no desejo de que aqueles homens fizessem um retorno a si mesmos, resgatando-os do opróbrio dos comportamentos adultos.
Os fariseus eram homens interessados em cortar, romper vínculos, enquanto as crianças, até de forma ingênua, querem sempre criar e construir vínculos e relações. Quantos mais relações as crianças têm, mais vivem felizes. A criança foi a estratégia mais sábia do Cristo para resolver a questão tão problemática do divórcio para os fariseus.
O discípulo não somente deve servir os pequeninos, mas reconhecer-se como pequeno. Quando nos reconhecemos assim, mais sentimos a ternura de Deus em nossa caminhada. Esta ternura é quem nos dá paz, fazendo-nos crescer na intimidade com Deus porque Ele se aproxima de nós à sua maneira, com ternura e compaixão. Com Deus, nossas as fragilidades não se tornam obstáculos, mas oportunidades de crescimento da fé e de expansão do espírito. A defesa da criança é relacionada com a dureza do coração daqueles que acreditavam serem os perfeitos intérpretes das leis divinas. As crianças conseguem olhar tudo e todos com misericórdia. Elas não constroem leis injustas e não julgam sem compaixão. A pureza de seus corações revela que o amor não é puro instinto, nem somente paixão, interesse ou superioridade. A pureza do coração da criança mostra a capacidade de ir ao encontro do outro como pessoa, para que ambos possam se ajudar tornando-se mais humanos, integrados e completos, conforme o projeto originário do Criador.
Senhor, ensina-me a disposição de construir vínculos saudáveis e relações sadias. Ajuda-me viver a pureza do coração tirando da minha vida toda a forma de dureza e de injustiça. Permita-me que, no encontro com os outros, eu possa ser mais humano e mais completo.
Bom Dia Frei. Gratidão por enviar essas palavras q nos esclarecem a verdade das relações. Reze por mim, por favor. 🙏🏽Paz e Bem. 🙏🏿