Homens e mulheres reconciliados
- Frei Luis Felipe C. Marques, ofmconv.
- 2 de nov. de 2024
- 4 min de leitura
Atualizado: 16 de nov. de 2024
Celebramos na festa de todos os santos nosso destino recordando tantos irmãos e irmãs que nos precedem na glória da eternidade. A santidade é processo e itinerário de vida. Ela não é simplesmente um alcance, a partir de méritos e virtudes, mas dom batismal vivenciado. Tornar-se santo consiste na integração entre o humano e o divino, entre o dom e a tarefa, entre a vocação e a crise, entre as dúvidas e as respostas. A santidade não é um fato que somente acontece no fim dos tempos, mas é a realidade atual daqueles que decidem pelo Amor na vida quotidiana. Ela é manifestada em nós quando deixamos fluir o Divino que nos habita. Quando vivemos na presença de Deus e somos plenificados.
A festa de todos os santos quer nos lembrar que a santidade não é um estado de bem-aventurança fora da existência humana, mas é a bem-aventurança escondida em nossa frágil humanidade.
Os santos que celebramos hoje, talvez nunca tenham tido visões, nem mesmo sonhado com realidades metafisicas, nem sequer proclamado profecias. Talvez não tenham operado prodígios e milagres ou dilacerado suas carnes com penitências. Os santos que hoje celebramos são pessoas que pecaram na vida, mas aprenderam, dentro das limitações e das vulnerabilidades, professar a vitória da misericórdia e da graça superabundante de Deus. Eles são aqueles que viveram o amor em segredo e o segredo do amor. Por isso, não trazemos, em nossa memória, somente os santos conhecidos ou aqueles que prestamos nossas devoções, mas o incontável número de testemunhos desconhecidos e silenciosos.
Hoje veneramos os santos que estiveram dentro de nossas famílias, que andaram em nossas ruas, que se sentaram em nossas mesas e que frequentaram os nossos templos.
Esta solenidade faz memória de tantos santos e santas que não foram reconhecidos pela Igreja. Entretanto, foram conhecidos nas particularidades de suas vidas, tocando nossa história, nosso tempo e nossas comunidades. A santidade é anônima e sem alarde, não é somente heroica; expressa-se no pequeno, no quotidiano, no usual. A ideia de santidade como algo distante daquilo que é humano é estranha à lógica de Cristo, do Evangelho e da fé cristã. Admitir nossa fraqueza e nosso pecado é o primeiro passo para a santidade. Aceitar ser imperfeito e saber viver a imperfeição é essencial.
Os santos que hoje veneramos dançaram, rezaram, abraçaram, choraram, amaram, se entristeceram, transgrediram em nome da liberdade, acertaram por causa do Evangelho e erraram devido seus limites. Afinal de contas, todos foram humanos, e, por isso, chegaram à santidade.
Os santos são aqueles que possuem o coração alargado como o de Cristo para acolher, doar e salvar vidas humanas necessitadas do amor divino. São aqueles que abriram espaços em suas vidas para os desconhecidos. Que na transparência de seus gestos, viveram os mesmos sentimentos de Cristo. Viver a santidade é estar certo de que nosso coração está em Deus e é tão largo como o Dele. Ser santo é viver em constante vibração e em infinita gratidão pelas maravilhas de Deus.
À luz do Evangelho, são santos aqueles que sabem apreciar a beleza da vida, que possuem coração generoso para contemplar a humanidade e que aprenderam devolver tudo a Deus. Os santos que celebramos fizeram das bem-aventuranças o caminho de seu viver. Eles não colocaram em suas vidas os mandamentos escritos em tábuas de pedra, mas inseriram em seus corações as bem-aventuranças.
O texto das Bem-aventuranças de Mt 5,1-12 inaugura o ensinamento de Jesus e apresenta as situações paradoxais que o discípulo é chamado a viver sem ceder à ditadura do momento. Os bem-aventurados são aqueles que não se deixam esmagar pelo peso da realidade. Os santos são homens e mulheres reconciliados consigo mesmos e com Deus, por isso, são capazes de oferecer reconciliação aos outros e ao mundo. Nessa reconciliação, eles vivem numa constante saudade de Deus e no desejo de viverem os sonhos de Deus aqui e agora. As Bem-Aventuranças são a proclamação da felicidade e não promessa da felicidade. Elas não nos servem como meta para conquistar a felicidade, mas são estrada do dia a dia a ser conquistada, pois felicidade não consiste em projetos maravilhosos do futuro e em impossíveis horizontes, mas consiste no aprendizado da vivência humano-divina do cotidiano.
A palavra de Jesus não indica meta ou recompensa resultante de um esforço individual. A santidade não é a busca de um perfeccionismo autorreferencial. Não é o cumprimento virtuoso de leis que nos servem como garantia futura. A santidade é a maneira original de viver o Evangelho, por isso, Jesus usa um adjetivo indicando a maneira de estar em diversas situações da realidade humana: no choro, no desamor, no desamparo e no desvalor. Esse é o paradoxo: a felicidade pode ser vivenciada em situações dolorosas da nossa história pessoal. Nessas situações criamos espaço para Deus, gerando esperança, fazendo crescer o amor e entendendo que a felicidade não é fruto do esforço humano, mas é a forma de corresponder o dom recebido de Deus.
Senhor, dai-me um coração humano-divino. Ajuda-me a viver a santidade no quotidiano e na aventura de fazer o bem. Ensina-me sentir teus mesmos sentimentos. Faça com que a tua graça ajude-me a corresponder ao dom recebido para viver a tarefa de ser testemunha real da tua presença no mundo.
Bom Dia Frei!! Gratidão por me enviar essas palavras inspiradoras e esclarecedoras. Tento viver para a santidade aqui e depois. Momentos de deslizes muitas vezes surgem, mas acredito na misericórdia do Senhor que me dá força para voltar sempre para Ele. “ …não faço o bem q quero, mas faço o mal q não quero…” Reze por mim por favor. 🙏🏿Paz e Bem.